Pandemia acelerou o processo de digitalização do mercado de seguros, mas nem todas empresas estavam preparadas, constata o professor
O corretor de seguros acompanhou nos últimos anos um crescimento das vendas diretas de produtos pela internet. Porém, esse movimento ainda é tímido e esses profissionais são os principal canal de distribuição do país. Segundo dados da Susep de janeiro, cerca de 125 mil consultores cadastrados correspondem a 80% dos contratos firmados.
A participação do corretor no mercado foi colocada à prova durante a pandemia. Boa parte das empresas precisou se estruturar também na internet, visto que ações como a captação de potenciais segurados e o atendimento ao cliente precisaram ser feitas à distância. O professor Arley Boullosa, um dos fundadores da Moby Corretora de Seguros, conta que poucas corretoras conseguiram se adaptar no ambiente online. “A maioria não se deu conta do que está acontecendo”.
A dificuldade de se adaptar na internet é concomitante com a baixa distribuição de corretores pelo Brasil. O estudo “Corretores de Seguros: distribuição por municípios do Brasil”, publicado pela Conhecer Seguros em setembro de 2021, mostrou que, enquanto no estado de São Paulo existia um corretor para 1.030 pessoas, em Roraima tinha um profissional para cada 28 mil habitantes.
Seguro Nova Digital – Com o crescimento das vendas de seguros online, você acredita que o corretor está perdendo espaço nesse mercado?
Arley Boullosa – A venda de seguros online no Brasil é incipiente e inexpressiva. O que temos da pandemia para cá é uma ida de muitas corretoras para a internet de forma completamente desestruturada. É preciso entender o que pode ou não ser digitalizado e para isso é necessário se colocar no lugar do cliente. A maioria das corretoras não sabe fazer porque isso exige muita pesquisa, estudo, planejamento e testes para avaliar com métricas o que deve ser continuado e o que precisa ser ajustado ou encerrado.
SND – Atualmente, pode-se dizer que o corretor está preocupado com essa concorrência?
AB – A maioria não se deu conta do que está acontecendo. A mudança é diária e muitos não entendem que precisam mudar para acompanhar o consumidor. Estou com seis consultorias em andamento em corretoras médias e, logo que chego para fazer um diagnóstico do negócio, percebo que possuem uma visão completamente equivocada de como a tecnologia pode nos ajudar na prospecção e como facilitadora de crescimento.
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SND – Você trabalha há muitos anos como professor e tem a sua própria corretora. Na sua avaliação, o corretor em geral tem vontade de se capacitar?
AB – Atuo no mercado de seguros há 33 anos e me dedico ao ensino e qualificação profissional da categoria por mais de 28 anos. Sempre estive muito próximo dos corretores e atendia comercialmente eles enquanto trabalhava em seguradoras.
A questão da falta de interesse por qualificação não é exclusividade dos corretores, mas também de seus funcionários. Temos uma questão estrutural que precisa ser trabalhada. Não existe crescimento, produtividade e aumento de rentabilidade sem um mercado muito mais qualificado que o que temos hoje.
Isso inclui também as seguradoras que perderam muito do seu conhecimento com a saída de profissionais mais antigos e experientes.
SND – Neste cenário com tendência a ficar cada vez mais complexo, qual corretor sobreviverá?
AB – Os corretores que investem em consultorias e mentorias serão aquelas que vão crescer ano a ano e seguir em frente. Os demais irão diminuir de tamanho e ter um futuro cada vez mais difícil com menos clientes e margens mais apertadas.
SND – Venda online e consultiva. Como unir estes dois mundos?
AB – Precisamos investir em tecnologia para melhorar nossas operações e principalmente para construir novos canais de captação e distribuição.
Quando começamos a MOBY no início de 2012, já existiam algumas corretoras fazendo a captação de leads na internet e fazendo a venda. Muitas apostaram em venda 100% online e já desapareceram do mercado. Não temos cultura de seguros e nem seguradoras preparadas para oferecer e fechar negócios sem a figura do corretor.
SND – E como você enxerga o crescimento das vendas pelos bancos digitais, por exemplo?
AB – Não é porque temos um banco digital com milhões de clientes no Brasil que a contratação do seguro pode seguir o mesmo caminho. São negócios completamente diferentes porque o seguro exige consultoria.
Os bons corretores sempre terão mercado e espaço. Os profissionais ruins e que não acompanharem as mudanças e necessidades dos clientes serão cada vez menores e muitos irão desaparecer.