A expectativa média de vida para os nascidos em 2020, segundo o IBGE, é de 76,7 anos, 80 anos para as meninas e 73 para os meninos. Em 1920, a média era de 33,4 anos. O aumento em mais de 100% na expectativa de vida no lapso de apenas 100 anos deveu-se, sobretudo, a aplicação de tecnologia que resultou em significativos avanços na medicina.
Sem qualquer minimização das conquistas no campo da saúde e à sua contribuição para o prolongamento da vida humana, dois pontos críticos resistem e os ganhos nas respectivas áreas não tem sido da mesma magnitude. Trata-se da (baixa) qualidade de vida e do alto custo dos cuidados nos dois últimos anos dos indivíduos.
Entretanto, mais recentemente, avanços tecnológicos parecem, por fim, estar prestes a diminuir o gap entre o ganho da longevidade e a qualidade de vida no período final deste ganho. A aplicação da inteligência artificial, robótica e big data tem obtido grande sucesso na prevenção e no tratamento de doenças crônicas, na determinação de diagnósticos mais precisos, em melhor controle na administração de medicamentos, na maior rapidez e acuidade em cirurgias e outros procedimentos invasivos e, até mesmo, no apoio ativo aos cuidados físicos de idosos.
Por outro lado, ninguém desconhece que gastamos pouco, muito pouco com a saúde, um setor subfinanciado ao longo de décadas e no momento que o país atravessa, certamente, com a estratégia de alocação de recursos para essa área comprometida, na disputa que mantem junto com a educação, pelos parcos investimentos públicos.
Os impactos financeiros da evolução demográfica brasileira nas contas públicas da saúde segundo os cálculos do Tesouro Nacional em seu recente boletim de riscos financeiros de 2019 serão vigorosos. Há expectativa de uma “pressão por expansão” de R$10,6 bilhões nas despesas do governo federal até 2027. Isso dentro de um cenário em que no Brasil, somadas as despesas públicas e das famílias para com a saúde, perfazem apenas um terço da média dos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).
A formulação de políticas públicas que “olhem com cuidado para a questão da eficiência, qualidade de serviços e equidade”[1] seria um primeiro passo para a redefinição do modelo brasileiro, segundo MIGUEL LAGO, que completa seu comentário acrescentando que no mundo inteiro os sistemas de saúde “são configurados segundo vontades setoriais além de questões circunstanciais e econômicas de cada país”[2] o que não traz muitas esperanças de ser alcançado.
Apostando em novas respostas para velhas questões, já é possível prever que em um futuro próximo a tecnologia tornará possível reduzir os custos, hoje quase insuportáveis e desafiadores da sustentabilidade do Sistema Suplementar de Assistência à Saúde e mesmo da Saúde pública – SUS – e se fazer imprescindível na gestão de serviços do SUS, de operadoras, hospitais, clínicas e consultórios, para além de uma atuação com menos falibilidade em intervenções, no passado, de exclusividade de médicos e outros profissionais da área da saúde.
Vida mais longa, com período produtivo também maior acompanhando a reforma da previdência e outras mais que virão, e um final de jornada mais feliz parecem nos espreitar na primeira curva do futuro. Que assim seja e que consolidado, o binômio longevidade e tecnologia venha nos trazer um possível happy end.
Gloria Faria
Advogada, sócia de MOTTA, SOITO & SOUSA Advocacia Empresarial, organizadora e articulista da Revista Jurídica de Seguros da CNseg.
[1] MIGUEL LAGO, diretor executivo do Iesp, professor visitante nas universidades Columbia (EUA) e Saint-Paul (França), em matéria do jornal Valor do dia7/01/2020 pg. A3.
[2] idem