Embora seja um movimento importante, especialista afirma que é necessário criar condições para que o brasileiro tenha acesso aos seguros
As iniciativas para implementar seguros personificados, acessíveis e atrativos no Brasil são mais recorrentes a cada dia. Seja por meio da Susep, o órgão regulador do mercado, ou pelas insurtechs, startups especializadas em trazer uma perspectiva inovadora para o ecossistema de seguros. Após o primeiro sandbox regulatório promovido pela autarquia federal, o Open Insurance é o próximo da fila dentro dessa onda de mudanças.
Em entrevista exclusiva à Seguro Nova Digital, Sidney Dias, diretor da Conhecer Seguros, expôs sua opinião acerca desse tema.
Seguro Nova Digital – Qual é o seu posicionamento acerca do Open Insurance, previsto para entrar de vez no Brasil em dezembro deste ano?
Sidney Dias – Vejo o Open Insurance como uma iniciativa necessária e inovadora para o mercado de seguros brasileiro. É compreensível que algumas das lideranças conservadoras deste nosso mercado estejam reticentes, pois muito pontos ainda estão sendo entendidos e detalhados. Enquanto isso não acontece, é natural a tendência de se defender as posições atuais: aquilo que é pouco conhecido tende a ser rejeitado, principalmente por quem está bem posicionado no mercado.
A condução do tema Open Insurance pela Susep vem sendo feita de forma bem adequada, sendo que ela está ouvindo todos os interessados em contribuir para a definição das diretrizes e regras que impulsionarão o desenvolvimento do mercado.
Uma coisa é certa: o Brasil não pode ficar de fora desse movimento e nenhuma barreira pode ser colocada para bloquear o avanço da iniciativa. Simplesmente deixar de tratar o tema por preconceito ou por medo do futuro, passando pelo receio do acirramento da concorrência, são sentimentos que não devem ser cogitados num país que deseja avançar. O mercado de seguros nacional está preso a procedimentos praticados há um século e, certamente, todos eles precisam ser revisitados.
S.N.D – No seu ponto de vista, essa mudança significativa no setor pode contribuir para atender mais pessoas que hoje não têm acesso ao seguro?
S.D – O Open Insurance é uma das várias iniciativas que vêm sendo conduzidas pela Susep que podem ajudar na ampliação do acesso a produtos de seguro e de previdência. Mas, ele é apenas um dos instrumentos e, por si só, não produzirá esse efeito que desejamos. Penso que criar condições para que mais pessoas tenham acesso ao mercado de seguros deve ser uma das prioridades no nosso País. Há uma grande distância, hoje, entre aqueles que contam com esse tipo de proteção para suas vidas, famílias e pequenos negócios e aqueles que, por falta de conhecimento ou de condições econômicas, não conseguem ter acesso às coberturas que poderiam ajudá-los.
A flexibilização das bases contratuais, que vem sendo promovida pela Susep, talvez seja um ponto com maior potencial de promoção dos seguros no Brasil. As seguradoras devem trazer muitos produtos e formas diferentes de comercialização, já testadas em outros mercados.
S.N.D – Como você analisa o cenário para o corretor de seguros, já que, entre outras coisas, o Open Insurance pode promover uma venda direta aos consumidores?
S.D – O corretor de seguros, no seu papel de consultor especializado em riscos e seguros, sempre será necessário e o Open Insurance não mudará isso. A pressão sobre o corretor de seguros vem sendo feita há vários anos por mudanças nos modelos de negócio que têm sido implementadas, particularmente, pelos conglomerados econômicos que detêm as maiores fatias do mercado. E isso tem limitado a participação e os rendimentos dos corretores de seguros.
Alguns produtos de seguros massificados já são comercializados, hoje, sem participação relevante do corretor no assessoramento dos consumidores. É o caso, por exemplo, de produtos do Seguro Viagem e do Seguro de Garantia Estendida. Outros produtos massificados, como Seguro de Vida e Seguro Residencial, são ofertados em agências bancárias e redes varejistas, sem que o consumidor possa contar com a orientação e o suporte efetivos de um corretor de seguros independente.
É pouco provável que as seguradoras tradicionais – ou as novas entrantes – efetuem, de forma relevante, venda direta aos consumidores de seguros massificados. Elas continuarão dependendo da especialização e da capilaridade de canais de distribuição – como canais bancários, redes varejistas e redes sociais, por exemplo. E, nesses canais, como já abordei anteriormente, é muito limitada a atuação efetiva de corretores de seguros independentes.
Nichos específicos, assim como os médios e grandes riscos, devem continuar contando com a participação efetiva dos corretores de seguros. Mas, mesmo aqui, vejo um fator diferenciador: atualmente, o corretor tem um grau maior de especialização técnica; quando se olha para o futuro, percebe-se que os corretores devem ser, cada vez mais, multidisciplinares, incluindo análise de aspectos financeiros. A formação do corretor de seguros, como vem sendo realizada, deixa de ser o modelo adequado e que, de alguma forma, funcionou nos últimos anos. Será necessária uma forte mudança no seu programa de capacitação e qualificação, assim como a atualização dos profissionais que já atuam.
S.N.D – No dia 7 de julho, o presidente da Porto Seguro, Roberto Santos, disse, em entrevista à TV Sincor-SP, que o Open Insurance não deve reduzir custos ao consumidor. Você concorda com essa afirmação?
S.D – Não tive a oportunidade de conversar com o Roberto Santos e, em consequência, não conheço detalhes da visão dele sobre o Open Insurance.
Focando especificamente a sua indagação quanto à possibilidade de redução dos custos ao consumidor com a chegada do Open Insurance: não creio que, por si só, o Open Insurance produzirá reduções significativas nos preços dos seguros. A sua adoção precisa ser conjugada com outras medidas – como investimento em educação financeira e novas formas de atuação dos corretores de seguros independentes, utilizando meios de comunicação adequados.
De toda a forma, creio que estamos num momento onde deve prevalecer muito mais o interesse sobre as coberturas ofertadas por determinado produto, objetivamente, do que apenas o preço. Os produtos nacionais precisam ser melhorados e ninguém discorda disso.
Uma simples análise do que já está acontecendo com a evolução das fintechs e dos bancos digitais mostra o desafio para a redução dos custos: eles passam a reproduzir os modelos de redes varejistas e de canais bancários já conhecidos, ofertando seguros aos seus clientes – muitos desses produtos com preços aparentemente bem atraentes. Mas, sem uma análise das coberturas e das condições, não é possível se dizer que o produto de menor preço será o mais adequado para atendimento das necessidades da pessoa interessada. E é nesse momento que se entende a importância tanto da educação financeira quanto do suporte ao consumidor por um consultor de seguros independente.
S.N.D – O Open Insurance pode ser como foi o Open Banking?
S.D – Vejo fortes semelhanças entre as iniciativas, mas não uma simples cópia do que estaria sendo feito no setor bancário para o setor de seguros e previdência. Na minha visão, o Open Banking é uma iniciativa em andamento, ainda nos seus estágios iniciais. Apesar desse nível de maturidade relativamente baixo, certamente já existe conhecimento que pode ser utilizado no Open Insurance – algo que, pelo que tenho acompanhado, vem sendo feito pelo Banco Central e pela Susep. Por outro lado, as seguradoras líderes do mercado são ligadas a bancos e, certamente, já contam com o compartilhamento do conhecimento desenvolvido na atuação no Open Banking.
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